Para a esquerda brasileira, a ex-presidente Dilma Rousseff é uma figura complicada. Seu governo (2011-16) associado ao déficit e à corrupção, terminou com seu impeachment. No entanto, ele também goza do respeito de seu padrinho político, Luiz Inácio Lula da Silva – popularmente conhecido como “Lula” – que foi presidente de 2003 a 2011. Atualmente, ele busca novamente a presidência. Embora Dilma tenha desempenhado um papel menor na campanha de 2022, o retorno do Partido dos Trabalhadores ao poder seria uma forma de reabilitação para a primeira mulher presidente do Brasil.
No início da campanha, analistas previam que Lula manteria Dilma Rousseff à margem. Afinal, seu índice de aprovação caiu para 8% abismais durante seu segundo mandato, graças à recessão e alegações de corrupção contra membros de alto escalão de seu partido. Em 2016, três quartos do Senado votaram para condená-la por supostamente manipular livros do governo para esconder o problema do déficit do Brasil. Também estava ligada à estatal de energia Petrobras, que estava envolvida em contratos e acordos de suborno. Dois anos depois, os eleitores ainda não a perdoaram: ela perdeu uma disputa pelo Senado contra um oponente praticamente desconhecido.
Apesar de seu exílio dos corredores do poder, Dilma nunca desapareceu completamente do cenário político. Mantém uma relação próxima com Lula. O jornalista Mauricio Savarese – que a entrevistou três vezes para seu livro, a queda de dilma, – enfatiza sua lealdade: “Sempre quis saber se ela tinha alguma crítica a Lula mas, se tem, ela guarda para quem é muito próximo dela”.
Rousseff era considerada uma tecnocrata sem muito carisma quando conquistou a presidência. Hoje é uma das personalidades mais aclamadas pelos seguidores do Partido dos Trabalhadores. Em recente evento na cidade de Porto Alegre, no sul do país, ele sentou-se na primeira fila, ao lado do candidato Lula e de sua esposa, Janja. Entre gritos de “Dilma, Dilma!” ela foi apresentada como “o coração valente” da esquerda. Lula também teve algumas palavras de apoio: “Toda vez que ele vem a um evento, fico feliz em ver que nosso povo reconhece a injustiça que sofreu”.
A figura do ex-presidente se encaixa bem na linha de campanha de Lula, que apresenta esta eleição como um momento decisivo para “restaurar” a democracia brasileira após quatro anos polêmicos de Jair Bolsonaro. Também é tentador aproveitar o lugar de Dilma na história como a primeira mulher presidente do Brasil… especialmente quando o atual Bolsonaro tem um índice de aprovação extremamente baixo entre as mulheres.
“Conheço a força da mulher brasileira. Vamos votar em Lula!” Dilma Rousseff em Porto Alegre, em uma convocação ao voto feminino.
O julgamento do impeachment de 2016, a maior sombra do governo Dilma Rousseff, já é notícia velha. Há poucos dias, o Ministério Público entrou com o processo devido a cortes orçamentários. Aqueles que antes defendiam o impeachment do ex-presidente começaram a mudar de ideia. Felipe Neto -um dos youtubers mais seguidos no Brasil- pediu desculpas nesta segunda-feira por ter apoiado seu julgamento político, chegando a publicar uma foto de Dilma abraçada a ele. O autor do pedido de impeachment – o parlamentar Miguel Reale Jr. – declarou seu apoio a Lula, porque, em suas palavras, a inação de Bolsonaro durante a pandemia foi “muito mais grave” do que Dilma Rousseff.
No entanto, o papel do ex-presidente na campanha não foi além de um punhado de discursos de Lula. Segundo o cientista político Claudio Couto, da Fundação Getulio Vargas, neste momento Dilma Rousseff não é um ativo nem um passivo eleitoral… mas isso pode mudar.
“Pode se tornar um passivo se aparecer demais. Por isso Lula fala muito das conquistas de seu governo e muito pouco das de Dilma”, destaca.
Também não está claro qual será o papel de Dilma se a esquerda vencer a eleição. Ela não é candidata ao Congresso. Lula descartou nomear seu ministro porque não se sentiria “confortável” dando ordens a alguém que já ocupou o cargo mais alto do estado. Além disso, o candidato fez algumas críticas leves ao seu protegido. Depois de chamar o primeiro mandato de Dilma de “extraordinário”, Lula disse em uma entrevista recente que acredita que ela cometeu alguns erros de política econômica durante seu segundo mandato. “Ela já sabe o que penso sobre isso”, declarou.
O jornalista Savarese acredita que Dilma continuará sendo uma conselheira sombra de Lula, longe dos olhos do público. “Dilma quer levar uma vida mais tranquila”, diz. Mas o jornalista também ressalta que não ficaria surpreso se um Lula triunfante lhe fizesse um gesto favorável durante a posse. Quando Dilma foi acusada, ela deixou o Palácio do Planalto, sede do Executivo em Brasília, em desgraça. Seis anos depois, Lula poderia trazê-la de volta pela porta da frente.